Ele costumava me ligar às
22h, e a partir das 21 eu começava a ser feliz.
Nos víamos toda noite
durante a semana, mas ainda assim ele me ligava e a voz dele era a ultima que
eu ouvia antes de dormir. Era difícil não sonhar.
Principalmente porque as
conversas duravam horas, ou ao menos eu tentava, pois sempre tive sono muito
fácil. Na verdade mais tarde descobri
que sua voz era quase canto de ninar, as palavras e a conversa fluíam tão
fáceis que me acalentavam, e o sono vinha.
Não digo que sempre
tínhamos assunto porque isso seria mentira. Por vezes passávamos minutos a fio
no telefone ouvindo a respiração um do outro ou naquela coisa boba de casal de
ficar pedindo para que o outro tome atitude - sua vez de falar alguma coisa, de
trazer um assunto, dizia um dos dois. Era nesse momento que ele dizia sua
frase, sempre a mesma: "esse é o momento que a gente beija",
referindo-se as conversas ao vivo, olho no olho.
Não consigo lembrar por
quanto tempo isso durou.
Lembro-me que varias
foram às vezes em que deixei-o falando sozinho ao telefone, porque eu havia
dormido. Nessas ocasiões ele ligava novamente e ria de mim por ter dormido.
Nunca ficou chateado e se ficou, não demonstrou.
Varias vezes dormi e
sonhei acordada com ele ao telefone, e então falava coisas sem nexo, que não
tinha sentido algum para a conversa.
Mas devo confessar, e
ele ha de admitir que também teve seus cochilos, principalmente nos dias em que
eu estava mais falante, cheia de assunto. Ele dormiu algumas vezes, mas sempre
soube disfarçar melhor que eu.
Disfarçar. Nossa, ele
era mestre. Talvez ainda o seja. Sinto como se houvesse se passado anos desde a
ultima ligação às 22h.
É que com o tempo os
hábitos e costumes vão mudando. Com essa tal modernidade então, tudo fica mais
instantâneo, e as boas coisas construídas juntos começaram a se perder.
Lembre-se, já falei isso
antes: eu não lembro quanto tempo isso durou. Mas eram os melhores minutos
antes de finalmente descansar amada.