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Full time

Urgente!  Ainda há vontade de vida na gente? Ruge é a sensação de dever não cumprido, vendido pelo comercial, Que diz que autocuidado é comprar skincare. Carece de sentido real, de cheiro de terra molhada, na urgência da materialidade da vida. Só quem respira sabe que o pulmão não tem tempo pro ar. Como é que o coração vai serenar? Meditar? Mano, nem sei como faz! A esteira de nascer, parir mão de obra e morrer foi forjada no estilo taylorista: Full time! Não tem descanso. Racionaliza-se todos os processos naturais, porque não sabes o dia de amanhã, e enquanto não morre, não pode serenar. Não para, não para não, até o chão. Qualquer refrão fala o mesmo. Nosso corpo virou máquina programada pra morrer de exaustão A música que embala nossas dores é serenata para quem lucra com nossa falta de sorte, a sorte deles é a nossa morte. Cadê a vontade de greve da gente?
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Você é fim de tarde

Você é uma poesia preste a ser parida. Prestes a ser engolida como a saliva de quem tem a boca seca, como a parada cardíaca de quem não cometeu excessos. Você é a personificação da licença poética, a calma de observar os pássaros que comem goiaba, o eco de uma mãe que soluça o nascimento do primeiro filho, a lágrima da adolescente que recebeu sua primeira carta de amor, o gemido de uma mulher quando goza. Você é o abraço de irmãos que não se vêem há anos, o colo de avó que acaricia a neta, o fim de tarde ouvindo o conselho dos nossos mais velhos. O primeiro bolo que não sola. Você é o sorriso da primeira composição de uma artista, o grito da menina de quatro anos que faz um gol, o suspense do homem que sabe ser inocente, a satisfação de quem aprendeu a nadar. Você é os primeiros passos do bebê, o sim do casamento, o olhar de cumplicidade entre melhores amigas. A risada da criança tomando banho de chuva. Você é o canudo do diploma da formatura, é a sensação do açúcar descendo pela lí

Meus pés pedem a terra e o meu corpo pede o sol.

Dias de quarentena de mim. Um olhar na barriga, outro no peixo e três no gato para não se perder dentro dos cômodos de casa. Um excesso de mim mesma e a única saída é esvaziar, deixar que o Eu desague, manso, leve, firme. A luz do abajur cega meu sentidos tortos e nublados pelo respirar fora de órbita. Meus pés pedem o chão. Toda eu sou feita de sonhos e teorias de conspiração neurótica. nada lúcido viver como quem sabe seus traumas, mas não os cura. Aterrar. Aterramento. Meus pés pedem o chão. Minhas raízes ora estão aguadas demais, ora secas e poeirentas. O que será que isso tem a ver com a minha mãe e avó? Que estranhas as entranhas da vida que solidificam meus nervos e evaporam meu sangue sem que esse caia na terra. A terra me expulsa de mim? O rio se retira do meu suor? As matas secam nos fios dos meus cabelos crespos? O que será que isso tem a ver com a ancestralidade que me sustenta e me põe de pé? Quantas são as mãos que me carregam e quais cores elas tem? Meus pés pedem a

Puberdade da vida adulta

Um dia eu vou me livrar da síndrome de ser perfeita. Não quero mais ter pretensões de maravilhosidade pré-fabricada. Um dia não me importarei mais com a multidão. Por enquanto sigo sendo esse minúsculo ser, cheio de pequenas maravilhas não fabricadas e recém descobertas. Tenho vinte e seis. Me acho mais madura agora, amanhã talvez não. Um dia, quem sabe, não me deixarei levar pela correria do dia, que me tira de mim e me joga no absoluto silêncio de quem não vê o tempo passar. Volto a ter os sonhos de criança e dores de nascimento que me dizem estar tudo bem, que é um processo chegar na puberdade da vida adulta. Só se aprende caminhando. Enquanto os hormônios me bulinam o corpo,  traço rota de fuga cantante e circense em meu coração de carne. Bailo meus defeitos e  coreografo a imagem que construí de mim mesma. Crio meu próprio espetáculo com aquilo que sou e humanamente aceito aquilo que me tornei.

Oxum é amor, Oxóssi é firmeza.

Os pássaros cantavam quando caminhei pelo entorno de Oxum. Sua melodia compôs a música que embalava meus passos. O vento, com sua leveza, coparticipou do soneto e misturou-se aos arranjos de vida que tocaram minha pele. Balançou levemente e persistentemente a estrutura óssea, pélvica, nervosa, capilar e emocional dentro de mim, tal qual o balanço das árvores verdes que crescem na beira do rio. O encontro de Oxóssi e Oxum me toca profundamente e desperta em mim a sensação de agradecimento pela vida, pelo ar que eu respiro, por ser quem eu sou. Meus olhos não se afastam do rio e nem do verde. Meus olhos contemplam a beleza dos pássaros que se banham e se relacionam nas águas deste rio. Eu vou seguindo e deixando o som da correnteza embalar minha respiração. Que eu seja a correnteza que passa e lava todo pensamento de desamor e toda forma de autossabotagem, porque Oxum é amor. Que eu seja como as árvores frondosas da mata, que balançam e permanecem de pé, enraizadas, porque Oxóssi é firme

Útero de nós mesmas

Nós vamos parir a revolução. Nós vamos parir a revolução. A nós coube a potência do gestar e estamos gestando a caída do muro, a construção da ponte, as cordas que nos puxarão para cima. Nós vamos parir um novo dia em que nosso parir não seja doloroso, não seja resposta de pecado, nem culpa pela dor do mundo. A gente tá parindo. Todo dia um filete de água burla a barreira das nossas calcinhas, desce e refresca nossas pernas e escorre em contato com a terra. Todo dia a água sai e se junta num grande rio. Estamos parindo a revolução de um dia que se constrói a partir da soma das nossas águas. Que encontra jeito e abre passagem entre as margens que oprimem. Estamos parindo e o nosso corpo é pura ebulição. Estamos nos transformando em vapor e condensadas na lâmina fria do machado afiado, vamos descer igual tempestade e fazer reviver os rios secos. Somos útero de nós mesmas e vamos parir a revolução.

Doses homeopáticas

Eu preciso de doses homeopáticas de mim, das dores da minha realidade. Psiquiatras e psicólogos são estágio último deste coma induzido. Eu estou em estado clínico de autopreservação, depois daqui não falta nada. Minhas dores são silenciosas porque a realidade se distrai com leituras e podcasts. Mas acredito em Gil, peço a benção e sei que um dia vou me livrar da síndrome do intelectualismo, da banalidade das coisas materiais, do arroto arrogante do exibicionismo e das algemas que é fingir ser e estar bem. Não estou. Não posso estar quando tem tantas e tantas coisas que me aprisionam, que me forçam até a beira do abismo e me pedem pra olhar lá embaixo. Eu não quero nomear, eu fujo dos nomes como meus gatos fogem da água fria, como as crianças correm em momento de galinha gorda, só que em direção contrária. Ninguém vê que a força de todo dia é máscara de quem não aguenta mais. Eu preciso de doses homeopáticas de mim porque eu quero continuar seguindo em paz, acordar do coma e ser fel