Não peço força a nenhuma de minhas irmãs hoje. Porque nos é negado o direito a dor desde que a gente nasce. Porque nos é negado o direito ao luto, por nós e pelos nossos. E a gente vai guardando tudo dentro da gente, acreditando que existe até mesmo uma vantagem nisso, que sufocar a dor e o choro vai engrossar as costas, vai nos fazer suportar mais. Mas todo copo cheio transborda. E a gente é bacia. A bacia que comumente vemos mulheres pretas carregando em cima da cabeça. Aquela bacia também somos nós e são as nossas dores. As que a gente carrega em nome da sobrevivência e ainda tem que andar de cabeça erguida porque não é a coroa que vai cair.
Eu não desejo força, eu não quero força. Eu tô cansada de ser forte e de não conseguir ser frágil, de não deixar de acreditar piamente que conseguiremos resolver tudo sozinha, se amar sozinha, se curar sozinha, se ajeitar sozinha. Tô cansada de não poder chorar, por mim e pelas nossas. Os tiros em Marielle são sentidos no peito, rasgando e queimando. De dor. Porque a gente sente dor. Mesmo vocês não acreditando nisso. Mesmo a bacia em cima da cabeça. Hoje eu preciso derramar minha água. Me lavar com ela. Sentir a água em todos em poros do meu corpo preto, curar as dores. Mas não posso mais fazer isso sempre sozinha.